O
crente não praticante
Rev.
Ricardo Rios Melo
É muito comum você perguntar a uma pessoa
sobre sua religião e, caso ela não tenha outra religião, ela responde: sou
católico não praticante. Isso significa que ela foi batizada em sua infância no
catolicismo Romano, mas não frequenta a igreja e, muito provavelmente, não
prática os dogmas católicos em sua vida.
Essas pessoas, invariavelmente, vão à igreja
apenas em eventos como batismos, casamentos e velórios. Possuem crenças místicas
justiçáveis dentro do seu pensamento e são sempre otimistas e condescendentes
com os seus erros disparando grandes frases: “Deus é pai não, padrasto”; “Deus
é grande”. São verdades ditas no vácuo.
Desastrosamente, nas últimas décadas, tem
surgido uma nova modalidade: os crentes não praticantes. Não estou falando diretamente
do movimento dos “desigrejados”, pois esses formam uma igreja sem igreja e não são
o foco desse arrazoado. Eu me refiro aos
que dizem pertencer a uma igreja, contudo não são frequentadores dela. Eles são
os crentes não praticantes. Eles aparecem, como diz o adágio popular, “de caju
em caju”. Quando indagados, dizem que
estão firmes em casa assistindo programas evangélicos. É o famoso crente Geninho[1]: temos que adivinhar e
procurar muito até o fim para o acharmos. Ele se mistura facilmente com as cores
do mundo.
Esse grupo, quando ora, é na hora do almoço e,
quando a coisa aperta, em situações extremas de doenças ou dificuldades
financeiras. São místicos também e sempre acham que no final tudo dará certo: afinal
de contas, dizem eles, “Deus é grande”.
Eles não leem a Bíblia e confundem Sofonias com sinfonia (se você não entendeu
a piada, precisa ler a Bíblia).
Alguns desses crentes nominais, quando vão à
igreja, escolhem apenas um turno para fazer sua fezinha ou sua parte: se
acordam sempre cedo, escolhem ir à igreja pela manhã, pois não será nenhum
sacrifício – já estão acordados mesmo! O período da noite eles deixam para seus
afazeres ou sua diversão. Não pretendem sacrificar seu domingo indo DUAS vezes
ao culto. Isso é fanatismo, diria um
crente nominal ou não praticante. São adeptos da lei do menor esforço quando se
refere à igreja.
Se não vão pela manhã, pois estão dormindo,
descansando da farra do sábado ou da semana puxada, irão à noite, pois querem
uma programação mais leve, desde que o culto termine cedo. Aliás, geralmente,
chegam bastante atrasados (isso infelizmente não é uma característica somente
desse grupo).
É claro que há pessoas que, por motivo de
força maior: doença, idade, casado com não crentes, trabalhos essenciais como
médicos plantonistas da área de saúde de modo geral, não podem ir aos dois
turnos. Entretanto, para o crente não praticante, a prioridade ou o serviço
emergencial é ele mesmo. Sempre tem algo que ele deixou inadiável para o
domingo.
Esses crentes nominais estão sempre cansados
e ocupados para a obra do Senhor. Não procurem eles, pois sempre estarão
ocupados. Alguns desses viajantes da fé estão sempre de férias – férias da
igreja. Alguns até são dizimistas fiéis, pois conferem ao dízimo um poder
místico: “quando eu dou o dízimo, sempre eu ganho mais no mês”.
Esses crentes ficam irritados quando
descobrem que, há muito, seus nomes foram excluídos do rol de membros, pois o
conselho fez o seu dever de casa e atualizou o rol. Eles bradam logo: “domingo passado eu estava
aqui” – só esqueceram de dizer o ano.
Há dentro desse grupo aqueles que são crentes
nominais, todavia querem ser “desigrejados” ou pior ainda: eles são a
igreja. São aqueles queridos amigos que
pregam, até leem a Bíblia, oram, fazem apelo a si mesmos, mas não veem nenhum
sentido em congregar como a Bíblia fala. Em uma linguagem do futebol: “cobram o
escanteio e correm para área para cabecearem a bola”. Esses são os críticos de plantão: o pastor não
presta, o sermão não presta, a igreja não presta, ninguém presta, ou melhor, só
ele presta. Ele é a autoridade para julgar todos os demais. Esse crente nominal
é diferente. Ele é perigoso! Pretende difundir sua ideologia “igreja” a outrem,
mas sem responsabilidade com o outro. Eles se julgam maduros e superespirituais.
Estão sempre prontos para apontar os problemas da igreja e justificar suas
ausências: “todos os domingos o pastor prega a Bíblia”, “essa é a interpretação dele”, “para quê ir a
igreja se eu penso diferente”, “a igreja é ideologia dos homens, Deus não
instituiu igreja” , “o importante é o amor ao próximo”.
Nada está bom para o crente nominal (não
praticante). Ele afunda uma igreja em segundos e funda sua própria igreja e
regras: “eu não preciso disso para ser crente”; “eu penso que a igreja dever
ser...”.
O problema é que Jesus veio para salvar a
igreja. Os “desigrejados” e os crentes virtuais terão que responder ao Noivo o
motivo de não gostarem do seu nome: igreja (noiva). Terão que responder o
motivo de não concordarem com as regras que o Noivo lhes impôs inspirando as
cartas pastorais e, inclusive, mostrando princípios litúrgicos. Por qual motivo
o Senhor daria princípios litúrgicos comunitários se não existisse igreja?
Os crentes não praticantes (nominais), foco
desse arrazoado, terão que enfrentar o noivo e responder o motivo de não
vigiarem e não esperarem o noivo com a lâmpada acesa: “Então, o reino dos
céus será semelhante a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram a
encontrar-se com o noivo. Cinco dentre elas eram néscias, e cinco,
prudentes. As néscias, ao tomarem as suas lâmpadas, não
levaram azeite consigo; no entanto, as prudentes, além das lâmpadas,
levaram azeite nas vasilhas. E, tardando o noivo, foram todas tomadas de
sono e adormeceram. Mas, à meia-noite, ouviu-se um grito: Eis o
noivo! Saí ao seu encontro! Então, se levantaram todas aquelas virgens e
prepararam as suas lâmpadas. E as néscias disseram às prudentes: Dai-nos do
vosso azeite, porque as nossas lâmpadas estão-se apagando. Mas as prudentes responderam: Não, para que não nos
falte a nós e a vós outras! Ide, antes, aos que o vendem e comprai-o. E, saindo elas
para comprar, chegou o noivo, e as que estavam apercebidas entraram com ele
para as bodas; e fechou-se a porta.
Mais tarde, chegaram as virgens
néscias, clamando: Senhor, senhor, abre-nos a porta! Mas ele respondeu: Em verdade vos digo que não vos
conheço. Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a
hora
“ (Mt 25.1-13).
Nas Escrituras, a palavra igreja está associada
a grupo, assembleia, corpo, reunião de pessoas. O apostolo Paulo diz que nós
somos o corpo e Cristo é a cabeça: 1 Co 12,27; Ef 3.6; Ef 4.12,16; Cl 1.18; 2. 19. O Novo Testamento
tem no mínimo 73 citações diretas e 74 indiretas com o nome igreja. Como não
existe exército de um homem só, não existe igreja de um homem só. Eu não sou a igreja. Você não é a igreja, mas
nós juntos somos a igreja. Igreja implica conjunto e pluralidade. A Bíblia afirma
categoricamente que foi pela igreja que Cristo, vero homem e vero Deus, morreu:
“Atendei por vós e por todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos
constituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele comprou com o
seu próprio sangue”
20:28.
Muitos confundem igreja com prédio. É verdade
que a igreja não está vinculada a um prédio ou edifício de tijolo. Nós somos os
tijolinhos de Cristo. Separados somos tijolos, juntos somos o edifício que Deus
está formando sobre o fundamento, a Rocha que é Cristo. Parafraseando uma ilustração
que ouvi de Joel Beeke, a igreja assemelha-se a uma grande construção: há
pregos soltos, entulho, vigas, paredes sem reboco, escadas, andaimes, pouca coisa
leva a acreditar que aquela obra empoeirada será um lindo edifício. Contudo,
mesmo no meio de tudo isso, Cristo está edificando sua igreja. O noivo vê sua
noiva linda e majestosa, imaculada, sem rugas: “para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem
mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito” Ef 5:27.
É interessante notar que muitos dão o
argumento de que, antigamente, os irmãos se reuniam de casa em casa e que,
portanto, agora não precisam de igreja. Isso é uma bobagem sem tamanho, pois as
igrejas que estavam nas casas eram igrejas estabelecidas com liderança:
presbíteros e diáconos. A ênfase não é no local, mas em como essa igreja era instituída. O espaço é pequeno para mostrar, por exemplo,
as cartas dirigidas às igrejas. É só ler as cartas paulinas. Atos dos
apóstolos. Leiam também Apocalipse e vejam
as cartas às igrejas.
Destituir a importância da organização igreja
no sentido do Antigo ou Novo Testamento é destruir os princípios e propósitos
divinos. Podemos discutir formas de governo, liturgias, local etc. Podemos não
concordar, criticar e até condenar os desmandos e escândalos que acontecem em
vários arraiais cristãos. Contudo, não podemos “desigrejar” a Bíblia e muito
menos fazer da crença uma mera ideologia ou museu. Os “desigrejados” e os
nominais terão que responder a O Cabeça e a O Noivo que é Cristo.
O maior problema do crente nominal é que o
seu nome poderá não constar no Livro da vida, pois o Senhor é claro: “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no
reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus” (Mt 7.21).
O entendimento equivocado da demora do Senhor
em voltar gera nos desavisados a falsa sensação de que o Senhor não voltará
mais. Portanto, há uma letargia assolando a igreja.
Sempre é bom lembrar as palavras do Senhor
por intermédio do apostolo Pedro: “Há, todavia, uma coisa, amados, que não deveis
esquecer: que, para o Senhor, um dia é como mil anos, e mil anos, como um dia. Não retarda o Senhor a sua promessa, como alguns a
julgam demorada; pelo contrário, ele é longânimo para convosco, não querendo
que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento” ( 2. Pe 3, 9,10).
Querido leitor, tenha cuidado, pois se nós
fossemos abençoados pelo compromisso que temos com o Senhor, ou se o Senhor
estivesse presente em nossa vida com a frequência que O temos buscado,
estaríamos perdidos!
Essa crise dos crentes nominais e dos “desigrejados”
já era um problema na era apostólica, não é à toa que o Espírito inspirou o
autor aos Hebreus ao dizer: “Não deixemos de
congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto
mais quanto vedes que o Dia se aproxima” Hb 10:25
Os crentes não
praticantes são mestres na prática da desculpa. Para esses o Senhor adverte: “e serás
bem-aventurado, pelo fato de não terem eles com que recompensar-te; a tua
recompensa, porém, tu a receberás na ressurreição dos justos. Ora, ouvindo tais palavras, um dos que estavam com
ele à mesa, disse-lhe: Bem-aventurado aquele que comer pão no reino de Deus. Ele, porém, respondeu: Certo homem deu uma grande
ceia e convidou muitos. À hora da ceia,
enviou o seu servo para avisar aos convidados: Vinde, porque tudo já está
preparado. Não obstante, todos,
à uma, começaram a escusar-se. Disse o primeiro: Comprei um campo e preciso ir
vê-lo; rogo-te que me tenhas por escusado.
Outro disse: Comprei cinco juntas de bois e vou experimentá-las;
rogo-te que me tenhas por escusado.
E outro disse: Casei-me e, por isso, não posso ir. Voltando o servo, tudo contou ao seu senhor. Então,
irado, o dono da casa disse ao seu servo: Sai depressa para as ruas e becos da
cidade e traze para aqui os pobres, os aleijados, os cegos e os coxos. Depois, lhe disse o servo: Senhor, feito está como
mandaste, e ainda há lugar. Respondeu-lhe o
senhor: Sai pelos caminhos e atalhos e obriga a todos a entrar, para que fique
cheia a minha casa. Porque vos declaro
que nenhum daqueles homens que foram convidados provará a minha ceia” (Lc 14. 14-24).
Alguém poderia objetar, “então você quer
dizer que, para uma pessoa ser salva, ela precisa estar na igreja? Exato! Isso não
significa denominação. Significa que você precisa pertencer ao corpo de Cristo.
É preciso permanecer na doutrina dos apóstolos e na comunhão dos santos: “E perseveravam na
doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações” (At 2:42). Você precisa pertencer à igreja visível, pois a igreja
invisível, aquela que somente o Senhor conhece, ele é manifestada na igreja visível.
Mesmo que dentro dessa igreja visível haja joio, o Senhor recolherá seu trigo
de cada igreja visível e cortará o joio: “Outra parábola lhes propôs, dizendo: O
reino dos céus é semelhante a um homem que semeou boa semente no seu campo; mas,
enquanto os homens dormiam, veio o inimigo dele, semeou o joio no meio do trigo
e retirou-se. E,
quando a erva cresceu e produziu fruto, apareceu também o joio. Então, vindo os servos do dono da casa,
lhe disseram: Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde vem, pois, o
joio? Ele, porém, lhes respondeu: Um inimigo
fez isso. Mas os servos lhe perguntaram: Queres que vamos e arranquemos o joio? Não!
Replicou ele, para que, ao separar o joio, não arranqueis também com ele o
trigo. Deixai-os
crescer juntos até à colheita, e, no tempo da colheita, direi aos ceifeiros:
ajuntai primeiro o joio, atai-o em feixes para ser queimado; mas o trigo,
recolhei-o no meu celeiro” (Mt 13. 24-30).
Termino com a nossa Confissão de Fé
de Westminster:
XXV.1- A Igreja Católica ou Universal, que
é invisível, consta do número total dos eleitos que já foram, dos que agora são
e dos que ainda serão reunidos em um só corpo sob Cristo, seu cabeça; ela é a
esposa, o corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todas as coisas. Ref.: Ef 1. 10,22,23; Cl 1. 18; Ef. 5. 23,27,32.
XXV.2- A
Igreja visível, que também é católica ou universal sob o Evangelho (não sendo
restrita a uma nação, como antes sob a Lei) consta de todos aqueles que pelo
mundo inteiro professam a verdadeira religião 1, juntamente com seus filhos 2;
é o reino do Senhor Jesus 3, a casa e família de Deus 4, fora da qual não há
possibilidade ordinária de salvação 5. Ref.: 1- I Co 1.2; I Co 12. 12,13; Rm 15. 9-12. 2-
Gn 17.7; Gl 3. 7,9,14 cf Rm 4; At 2.39; I Co 7. 14; Mc 10. 13-16. 3- Mt 13. 47;
Cl 1. 13; Is 9. 7. 4- Ef 2. 19. 5- Mt
28.19; At 2.38; I Co 12.13; Mt 26. 26-28.
Deus converte os seus!
Rev. Ricardo Rios Melo
[1]
Personagem de um antigo desenho animado chamado She-Ha onde ao final do episódio
as crianças tinham de encontrá-lo no meio do desenho. O detalhe era que o
colorido dele parecia com o cenário, ou seja, era muito difícil encontrá-lo.
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