Entre o abismo do mundo
Lá estava um homem, velho. Olhando para longe. Entre ele e um ponto distante, havia um abismo. Com bastante persistência, ele percebe que ao longe não era um ponto que ele mirava, mas pessoas que, de tão distantes que estavam, pareciam formigas se movimentando.
De repente, surge no horizonte um perigo terrível. Aquelas pessoas que estão do outro lado do abismo serão destruídas. O homem tenta de todas as maneiras avisar sobre o perigo iminente: brada, pula, acena, mas sem êxito. Em desespero, tenta fazer uma ponte para alcançar o outro lado do abismo. Ele passa um bom tempo fazendo isso. Ao final, consegue chegar perto daquelas pessoas. Vê, em cada rosto, sua semelhança. Ele se espanta ao perceber que as pessoas são tão semelhantes, mas não entendem nada do que ele fala. É a mesma língua, são os mesmos sinais, contudo não conseguem compreendê-lo. Então, ele apela para recurso visual, tenta pintar em cores vivas o perigo que lhes sobrevém. Eles olham para a tela, acham bonita a pintura e o artista, mas não entendem a mensagem que ele quer passar. O homem se entristece. Chora, pois terá que voltar sozinho.
A essa altura, ele já se apegou àquela gente. Fez amizades. Construiu laços. Teria sido, o seu esforço, em vão? Ele não se contenta. Busca incessantemente comunicar a mensagem para eles. Então, tem uma idéia: que tal decodificar os símbolos? Bom, se eles não entendem o que falo, falando-lhes a mesma língua, é porque, na verdade, nós não falamos a mesma língua (refletiu). Pensou mais ainda: se eles não percebem a profundidade da minha pintura, é porque não estou pintando corretamente.
Aquele homem passou um bom tempo aprendendo a língua local, pediu emprestadas as tintas e pincéis dos moradores do lugar. No primeiro momento, ele tentou fazer uma pintura que aquele povo estava acostumado e gostava, mas o resultado foi desastroso. Quase o bom homem se manchou com as tintas de maneira permanente. Depois, usou as tintas e os pincéis, e pintou uma tela da forma que deveria ser, mas com uma clareza impressionante. Tentou novamente se comunicar.
Para sua surpresa, as pessoas ficaram desesperadas pela notícia da destruição que viria sem demora. Perguntaram-lhe, o que poderiam fazer para escapar da destruição. Ele lhes respondeu: – Nada! – Nada? Assustaram-se com a resposta. Podemos reunir um exército tão numeroso que nada ou ninguém poderá nos derrotar. O bom homem respondeu: nenhuma força humana poderá aplacar a destruição. – Então (intercalou o povo) porque nos mostrou com cores tão vivas a destruição de nosso povo, se não temos como fugir? Respondeu o homem: – Eu disse que não podem fazer nada pelo seu próprio esforço, mas tem uma pessoa que pode fazer por nós. Ele é tão poderoso que poderá aplacar a ira e receber sobre si a morte que era para nós. Basta que se arrependam dos seus pecados, do seu orgulho e creiam nEle de todo o coração.
Após ter dito essas coisas, muitos aceitaram o aviso e acreditaram na mensagem, outros não. Aquele homem guiou os que a aceitaram para o lugar em que ele morava, enquanto os outros foram destruídos por um fogo que nunca, jamais homem algum poderia imaginar.
Quero lhes contar outra história, na verdade, devo dar créditos ao autor, Jesus:
“Ora, havia certo homem rico que se vestia de púrpura e de linho finíssimo e que, todos os dias, se regalava esplendidamente. Havia também certo mendigo, chamado Lázaro, coberto de chagas, que jazia à porta daquele; e desejava alimentar-se das migalhas que caíam da mesa do rico; e até os cães vinham lamber-lhe as úlceras. Aconteceu morrer o mendigo e ser levado pelos anjos para o seio de Abraão; morreu também o rico e foi sepultado. No inferno, estando em tormentos, levantou os olhos e viu ao longe a Abraão e Lázaro no seu seio. Então, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim! E manda a Lázaro que molhe em água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro igualmente, os males; agora, porém, aqui, ele está consolado; tu, em tormentos. E, além de tudo, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que querem passar daqui para vós outros não podem, nem os de lá passar para nós. Então, replicou: Pai, eu te imploro que o mandes à minha casa paterna, porque tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de não virem também para este lugar de tormento. Respondeu Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos. Mas ele insistiu: Não, pai Abraão; se alguém dentre os mortos for ter com eles, arrepender-se-ão. Abraão, porém, lhe respondeu: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos” (Lc 16. 19- 31).
Primeiro gostaria de ressaltar as diferenças entre as histórias acima contadas. A primeira é totalmente ficção, mas a moral desta história é uma realidade para nós. A segunda é uma parábola de Jesus, portanto é a Palavra de Deus.
Na primeira história, o homem bom pôde passar o abismo e comunicar o perigo. O primeiro abismo que ele rompeu foi o abismo da própria comunicação. Depois, conseguiu romper o abismo das terras e resgatar alguns que estava do outro lado do abismo.
Na segunda história, a coisa é muita mais forte, pois o homem rico não pode superar o abismo da morte. Ele não podia voltar à vida ou aparecer como um fantasma, ou guia espiritual qualquer, para anunciar aos seus sobre os tormentos do inferno. Aliás, a parábola diz que eles tinham a mensagem dos vivos escrita para ouvir: Moisés e os Profetas. Não há nenhum sentido em ressuscitar alguém que morreu, pois se eles não conseguiam ouvir a Bíblia, ou seja, Moisés e os Profetas, “tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos”.
Querido irmão, se não entender a linguagem da nossa sociedade, você continuará gritando no vazio. Anunciará uma mensagem tão preciosa e importante para a vida eterna sem que ninguém consiga entender.
Querido amigo, na primeira história, as pessoas tiveram tempo para se salvarem. Na parábola de Jesus, o tempo que você tem é hoje, é agora: “porque ele diz: Eu te ouvi no tempo da oportunidade e te socorri no dia da salvação; eis, agora, o tempo sobremodo oportuno, eis, agora, o dia da salvação” (2 Co 6.2).
Rev. Ricardo Rios Melo
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